A verdadeira Alice.

Alice era uma menina que não sonhava.
Nunca sonhou, em nenhum momento de sua vida. Talvez o tenha feito quando era
criança, ingênua, inocente, mas hoje não mais.
Alice acha que os sonhos não levam a lugar algum, somente ilusões.
Não se achava do tipo 'realista', ou muito menos 'pessimista', mas otimista ela
tinha certeza que não era.
Para ela, tudo que viesse, seria fruto do seu esforço, do seu querer. Se ela
lutasse para tal, se ela quisesse realmente e se empenhasse para conseguir, ela
alcançaria o seu objetivo, assim como fez centenas de vezes.

Entretanto, apesar de ser do tipo que não sonha, Alice sempre acreditou.
Sim, acreditar mesmo! Ter fé. Não fé em Deus, ou fé nos homens, mas fé em si mesma.
Mesmo em um mundo de mentiras, de trapaças, enganações, ela sempre acreditou.
É fato que sempre soube que haviam pessoas à sua volta que simplesmente queriam
se aproveitar de sua boa vontade, de seu dinheiro, de sua alegria, de suas maldades
(às quais não tinham coragem de cometer sozinhos)...
Mas em nenhum momento Alice reclamava, afinal de contas, ela se divertia com tudo.
Ela era feliz com tudo. Ela construia todas as suas verdades com as experiências
vividas das mentiras dos outros. Era ali que ela aprendia, que ela crescia.

O que Alice nunca admitiu, foi que dissessem para ela que o que ela fazia era em
vão. Que o seu esforço era inútil, que de tudo que ela fez nada valeu, pois uma hora ou outra iria acontecer.
Pode até ser assim, mas Alice tinha sempre certeza de que foi o seu acreditar que
tornou tudo tão gostoso de se lembrar. Foi o seu acreditar que a faz ver cartas
perderem as cabeças no País das Maravilhas e que também a fez navegar entre os
espelhos no País dos Espelhos.

Podiam sim sempre estar usando Alice, mas Alice sempre conseguiu fazer com que
o fato de a usarem se tornasse o contrário. Era ela que os usava para construir
suas alegrias, suas risadas, suas lembranças, suas histórias...

E assim, até hoje a Alice vive.
Não que ela viva sendo usada, mas sim usando cada oportunidade que tem, para
acreditar que ela sempre vai poder tirar de tudo, pelo menos uma linha para
escrever a sua história.